“O Banco Central (BC) irá realizar um leilão de dólares para conter a alta da moeda americana.” “O Banco Central irá aumentar a taxa de juros para conter a inflação.” Essas são manchetes comuns na mídia quando se trata de assuntos econômicos. Apesar de muitos encontrarem certa dificuldade em relação ao tema, todos os brasileiros são diretamente afetados pelas decisões do BC. O Banco Central corresponde à autoridade monetária do Brasil, tendo como principal função determinar a política monetária, cuidando de assuntos como inflação e câmbio.
Desde a década de 1990, os Bancos Centrais de diversos países e blocos econômicos ganharam a missão de estabilizar a economia a níveis baixos de inflação através do regime de política monetária de metas de inflação. A fim de controlar a inflação em um país com histórico de hiperinflação, a principal ferramenta da instituição é a Selic, taxa básica de juros da economia brasileira, que é revisitada a cada 45 dias. Aumentos na Selic geram aumento nos juros pagos, por exemplo em cartões de crédito e financiamentos, desestimulando o consumo e o investimento. A partir disso, há uma diminuição da demanda agregada¹, levando a uma queda na inflação.
Diante disso, para compreender como funciona a determinação de uma política monetária do Banco Central, ressalta-se uma estrutura de 3 perguntas principais, as quais na prática são equações matemáticas de uma modelagem macroeconômica. Inicialmente, entende-se o que o banco está tentando alcançar e, como já mencionado, em muitos casos seu objetivo principal é estabilizar a economia através de um produto de equilíbrio e meta de inflação. Em segundo lugar, levanta-se quais forças impedem o banco de atingir sua meta. Para tal, as expectativas e perspectivas do mercado e da população são essenciais. Por fim, pensa-se em como traduzir os objetivos levantados em política monetária, considerando as restrições econômicas apresentadas.
Há mais de 30 anos, discute-se a autonomia do banco no Brasil. Até então, essa era a única agência reguladora que ainda não tinha mandatos fixos para a sua diretoria. Em outras palavras, o Presidente da República era responsável por indicar os diretores e o presidente do banco, o que significa que a qualquer momento o executivo do banco pode ser demitido. No fim do ano passado, o Senado aprovou um projeto relacionado ao tema, sendo validado pela Câmara de Deputados um projeto de lei que prevê autonomia do Banco Central na última quarta-feira (10/02). Ressalta-se que este ainda precisa passar por sanção presidencial.
O projeto busca garantir um mandato fixo dos diretores e do presidente do Banco Central, que não deve coincidir com o do Presidente da República. O principal objetivo dessa medida seria separar o ciclo político do ciclo da política monetária, a fim de garantir uma gestão técnica da economia e que não esteja submetida a interferências políticas. Isso é importante para evitar o chamado viés inflacionário, no qual o presidente pressiona a autoridade monetária a estabelecer a economia acima do pleno emprego para obter vantagens políticas e eleitorais. Diversos são os casos em que, próximo à eleição, o governante impõe que o BC abaixe os juros, aumentando a atividade econômica e, consequentemente, aumentando a sua popularidade.
A Lei de Autonomia não significa a independência completa do Banco Central. Na prática, essa lei apenas cria uma dificuldade institucional de demissão dos executivos do Banco Central. Dessa forma, em casos de insatisfações causadas pela tomada de um rumo econômico diferente do desejado pelo Presidente da República, a demissão da autoridade monetária será muito mais complexa. Além disso, o BC continuará seguindo as diretrizes do Conselho Monetário Nacional para tomada de decisões a respeito da sua política, isto é, ele não se tornará completamente independente.
Muitos afirmam que tal autonomia trará benefícios importantes para o Brasil no médio e no longo prazo. Experiências internacionais evidenciaram que mais autonomia levam a uma maior estabilidade do sistema financeiro, devido a menor volatilidade da inflação, já que a instituição consegue atingir seus objetivos com maior facilidade. Isso contribui para o aumento da credibilidade e da confiança por parte dos agentes econômicos no Banco Central.
Aqueles que são contrários à medida argumentam que o banco se tornaria mais suscetível a pressões do mercado financeiro. Contudo, na prática, todas as decisões do Banco Central, com ou sem a nova lei de autonomia, já levam em consideração a reação do mercado, através das expectativas dos agentes econômicos. Dessa maneira, o BC apenas continuaria sujeito à influência do mercado, não alterando o cenário atual.
Por fim, vale compreender quais são as obrigações do Banco Central com a nova lei. Esta estabelece como objetivo principal a inflação na meta e a estabilidade dos preços. Como objetivos secundários, tem-se: fomentar o pleno emprego, suavizar o ciclo econômico, e manter a estabilidade do sistema financeiro. Dessa forma, no Brasil, coloca-se um peso maior em manter a inflação na meta do que o emprego de equilíbrio, diferentemente dos Estados Unidos, por exemplo, em que o mesmo peso é dado às duas variáveis.
Revisão: Letícia Fagundes e Julia Rodrigues
Imagem de capa: Fabio Rodrigues/Agência Brasil
¹ Demanda agregada: soma da demanda de todos os agentes e setores da economia.
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