Hoje estava conversando com minha amiga sobre ansiedades da vida, faculdade, estágio e coisas do gênero, e ela me disse: “você tem um caderninho para escrever?”. A resposta foi “não”, talvez surpreendente para mim, como alguém que cresceu escrevendo até nas paredes do box do banheiro para não esquecer as ideias que surgiam na cabeça. A verdade é que, conforme cresci, as palavras tornaram-se mais assustadoras. A escrita, que antes era um refúgio, tornou-se espaço de cobranças e inseguranças.
Os poemas e os contos cederam às pressões do vestibular, sendo substituídos por textos argumentativos e redações do Enem. Continuei tentando criar espaço para a escrita, inclusive entrei para a Gazeta assim que comecei a faculdade. E por um tempo deu certo. Voltei a escrever e reencontrei nas crônicas minha paixão pela palavra — a Gazeta tornou-se minha versão do caderninho que minha amiga havia me sugerido.
Mas, no segundo semestre do segundo ano da faculdade, de novo, as pressões da vida forçaram a escrita para o segundo plano. As matérias ficaram mais difíceis, tornei-me editora-chefe na Gazeta e me vi cercada de pressões e exigências, muitas delas criadas pela minha própria cabeça. Assim, o documento em branco que eu abria toda vez que tentava escrever um texto voltou a ser meu inimigo e parei de entregar textos com a desculpa que tinha muita coisa para fazer como editora.
Esse bloqueio criativo continuou por muito tempo. Queria escrever um texto para me despedir da Gazeta, inclusive cheguei a escrevê-lo, mas não gostei e decidi não postar. Tinha a impressão que talvez com essa nova fase da vida a escrita criativa tivesse, de fato, ficado para trás. Porém, hoje, um pouco pela provocação de minha amiga, encontrei-me motivada a encarar o documento em branco novamente. E, pela primeira vez em muito tempo, as palavras voltaram a fluir. Para ser sincera, no início, este texto nem ia ser sobre escrita. No topo desta página, continua o título original “tradições da vida adulta”. Mas, na minha experiência, as palavras têm vida própria e hoje decidiram seguir por outro rumo.
Sei que o caderninho ao qual minha amiga fazia referência seria mais algo na linha de um diário, um lugar para escrever meus pensamentos, dúvidas e angústias. Mas, de certa forma, só sei falar sobre mim assim, em crônicas, poemas e contos. Então, está aqui a primeira folha do meu novo caderninho.
PS: Fiquei na dúvida sobre postar este texto, considerava meu capítulo na Gazeta definitivamente encerrado e achei meu texto muito autocentrado. Mas, como editora-chefe, descobri que várias pessoas compartilham dessa minha experiência com a escrita, desse bloqueio criativo que surge quando as pressões tornam-se altas demais. Então, quis deixar este texto aqui como uma esperança para meus queridos redatores de que, às vezes, quando menos esperamos, as palavras voltam a surgir. Este texto é para vocês, e espero que um dia eu volte a ver seus textos por aqui.
Autoria: Sofia Nishioka Almeida
Revisão: Ana Carolina Clauss e Vinicius Floresi
Imagem de capa: 123 colorir
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