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O FIM DA PICADA


É o fim da picada! Os marimbondos infestam os corpos dos moribundos que, ainda vivos, já foram a óbito. Já foi-se tudo! Da carne se vê os ossos. Na cabeça não se vê pensar. Se vê, contudo, os olhos olharem. Os olhos piscarem. Os olhos quererem. Onde já se viu, inveja num corpo sem vida.

Não se vive mais ali. A carcaça se move. Rasteja e se destroça em busca do infindável. Me atenho, aqui, à importância dos artigos. A carne se esvazia na insuficiência do ser melhor ou mais e se sustenta na possibilidade de, um dia, quem sabe, se tornar maior que o limite do corpo. O melhor. O mais. O maior.

Os complexos de grandeza tendem a indicar pouca força. Veja só, como pode, tão pequenos, os marimbondos, rodeando um corpo gélido e apático. Quando os olhos cansarem de olhar, piscar e querer, a ordem de grandeza será completamente insignificante. Como em qualquer sistema, a carcaça é, na verdade, alimento de abutre.

Realmente, não tem mais jeito. O invejoso se matou em vida por não viver mais por si. Quando os olhos se fecham, vem um enxame.

Sai no jornal a notícia: “empestearam os corpos moribundos que, ainda vivos, foram a óbito”. O fim da picada.


Autoria: Ana Luisa Issy

Revisão: Anna Cecília Serrano e Laura Freitas


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