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PRÓXIMO



Ontem, me questionei sobre o que relatar, criticar ou criar. Hoje, revisitei o que já foi publicado tentando encontrar uma ponte que me levasse ao assunto de um último texto. Amanhã, espero ficar satisfeita com as linhas que desatei, mas ainda estou no “hoje”. Nessa procura do que falar, aceitei a tarefa de ler as reflexões e os sentimentos de cerca de um ano e meio atrás, quando escrevi meu primeiro texto por aqui. Muita coisa mudou.


Em uma espécie de retrospectiva, percorri mentalmente o caminho que minha caneta um dia traçou, flagrando o que eu deveria ter escrito e, também, o que não deveria, o que foi dito de forma certeira e o que eu ainda gostaria de arriscar dizer. Entendi, finalmente, que não consigo mudar nada que passou e que este último texto não é capaz de fotografar as experiências que foram suscitadas durante esse período, tampouco abarcar tudo que ainda é ideia e precisa se converter em texto.


Desse modo, dado que o final não dá conta de tudo, é necessário direcionar o olhar ao trajeto, o chamado “meio do caminho”. Em qualquer que seja o processo, o ínterim entre o início e o fim guarda a procura, a curiosidade, a descoberta e o amadurecimento. É no meio do caminho que abrimos e fechamos ciclos, conhecemos pessoas e deixamos coisas para trás. Em outras palavras, muitas vezes a gente espera por um produto final e um desfecho radiante, sem se dar conta do passo a passo e da metamorfose provocada.


O produto dessas reflexões é a certeza de que o ponto final deste texto significa que estou pronta para começar um próximo, atenta aos processos e deixando sempre uma brecha para apontar e gritar quando for preciso. Aqui, ato o ponto: nossa vida está repleta de últimas vezes que precedem ótimas novas chances e descobertas. Quer ver?


A última vez que eu ouvi algo novo sobre o amor, tive vontade de amar de novo — e foi escutando Liniker. A última vez que li um bom livro, prometi, um dia, escrever um. O último desenho que fiz, perdi. No último mergulho que dei, me senti mais viva do que nunca. A última roupa que comprei, manchou. Na última ressaca, prometi nunca mais beber. No último pôr do sol ao qual assisti, quis mais uma xícara de café. Na última vez que vi um amigo, discutimos. Na última vez que escrevi, não consegui dizer tudo que tinha para dizer.


Eu vou ouvir outra música, ler outro livro, fazer outro desenho, mergulhar novamente, comprar outra roupa, abrir mais uma latinha de cerveja, assistir ao sol poente mais uma vez, rever meu amigo e achar mais uma página em branco para preencher. Para o bem ou para o mal, tudo passa. As últimas vezes não são o fim porque a vida é um infindável “próximo”.




Autoria: Ingrid Bonfim

Revisão: Bruna Ballestero

Imagem de capa: The New York Times



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