Já faz um tempo que venho me sentindo assim. A angústia. A ansiedade. O receio de não ser suficiente. O medo do fracasso.
Muitos alunos da GV eram estrelinhas antes de entrar na faculdade (afinal, não é um vestibular fácil). Os alunos que nunca se preocuparam em pegar recuperação. Aqueles acostumados a ir bem em provas sem se estressar muito. Os que conquistavam o coração dos professores e a admiração de colegas. Os que ficavam chateados por tirar um 7, um 8, ou até mesmo um 9. Aqueles que tinham facilidade na escola, se sentiam (ou achavam) que eram os mais inteligentes.
Logo que entramos na GV sofremos um choque de realidade: agora todo mundo é assim. Somos todos estrelinhas ou ninguém mais ocupa esse lugar? Segundo meu professor, o mínimo para se formar em Direito é a excelência, e suas notas condizem com essa afirmação: na sua matéria, o 6 é a excelência. Não são todos que pensam igual, mas o rigor com certeza é muito maior do que eu ousava pensar na escola. Os 10 deixam de chegar, e o esforço para conseguir um 7 já não é mais o mesmo. O sentimento de que meu intelecto não é mais suficiente domina minha mente.
Escrevo isso enquanto deveria estar cuidando de obrigações da minha graduação e das mil outras funções que eu decidi pegar pra mim, sabe-se lá por que. Escrevo isso, não no meu tempo livre, mas no tempo que decidi tirar para mim. Curioso que o meu intervalo de uma obrigação é outra obrigação, afinal, assumi a responsabilidade de escrever esse texto com um prazo de entrega.
A verdade é que agora não consigo fazer nada mais. Agora as lágrimas escorrem pelo meu rosto e embaçam minha visão. Agora não consigo assimilar as palavras de um acórdão. Agora não consigo bolar frases coesas para escrever um texto.
Às vezes me pergunto se escolhi errado. Às vezes me pergunto se sou capaz.
***
Felizmente, surgem respiros. Percebi que não adianta me estressar por matérias que eu não gosto, não tem problema focar naquilo que me agrada e fazer somente o necessário pra passar nas outras matérias. Não tem problema focar nas minhas amizades, nas relações que me fazem ter vontade de continuar. Não tem problema focar nos esportes e entidades que me prendem na GV, mais do que qualquer aula obrigatória.
Querendo ou não, ter com quem compartilhar essa experiência torna tudo mais leve. Anseio pelas conversas nos intervalos, pelos pequenos passeios durante as aulas, as idas ao banheiro para fofocar, as excursões até o SESC depois da aula. Tem dias que até esqueço do estresse da entrega de trabalhos e da pilha de textos que tenho para ler, esqueço até mesmo que a aula está cansativa (ou que eu sequer estou na aula). O verdadeiro ânimo para ir a algumas delas é a certeza de que vamos jogar Stop ou Gartic, e ter que segurar a risada ou sair correndo da sala pra rir longe do professor. Claro que a educação é importante e tudo mais, mas todos sabemos que metade do motivo para irmos a aula é a ideia de ver nossos amigos e se divertir no meio do caminho.
Tem gente que até esquece que curso que faz, eu digo que um amigo meu faz jornalismo, a outra faz música e eu faço educação física. Algumas entidades acabam tomando mais o nosso tempo do que poderíamos imaginar, o que não deixa de ser cansativo, mas é com certeza um ponto alto de nossos dias. Traduzindo para você, leitor, que não conhece meus amigos, o jornalista dedica todo seu tempo a Gazeta, a música é da bateria Tatu Bola, e eu faço handebol e natação. Tem também aqueles que vivem mais pras suas empresas juniores do que qualquer outra coisa. E assim, vamos preenchendo nossa rotina com pedaços que gostamos e desgostamos, nos rodeando por pessoas que amamos e algumas que escolhemos tolerar. Se um dia alguém me disser que gosta de absolutamente tudo que faz em todos os momentos, eu terei certeza que ela está mentindo.
Não digo que não gosto de direito, às vezes saio animada de aulas, às vezes me vejo fazendo exatamente isso no futuro. Mas nunca aprendi a estudar do modo que me exigem, nunca achei minhas matérias tão difíceis, tão demandantes. Nunca me senti tão cansada e tão esgotada. Nunca imaginei que a faculdade que eu escolhi, que deveria atrair mais meu interesse, seria tão desinteressante por vezes.
Hoje sei que não sou uma estrela num céu escuro, sou um brilho que desaparece no meio do céu estrelado, e sinto que me apago cada vez mais. Não digo que deixei de ser uma estrela, ou mesmo que me apaguei completamente, mas sei que não sou o destaque que um dia já fui. Cada um de nós continua a ser uma estrela brilhante, que não deixa de ter sua importância só porque uma estrela que ilumina mais o céu apareceu. Olhando da Terra, não sabemos qual estrela que tem o maior brilho, é tudo uma questão de perspectiva. Teremos mais luz onde desejarmos brilhar.
Autoria: Elis Montenegro Suzuki
Revisão: André Rhinow e Artur Santilli
Imagem de capa: Starlight Night, de Georgia O'Keeffe
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