Acorde às 5:30 da manhã, ou um pouco mais tarde se preferir, o importante é ser antes do nascer do sol. Tome um banho gelado e faça a sua rotina de skincare. Gel de limpeza facial, tônico, sérum de vitamina C, hidratante e protetor solar. Sempre nessa ordem e incluindo o uso do Retinol duas vezes por semana. Vá para a cozinha e tome seu shot matinal de limão, cúrcuma e gengibre, ainda em jejum, seguido de um copo d’e água em temperatura ambiente. Beba tudo com a mesma convicção de quem acabou de encontrar o segredo da imortalidade aos vinte anos de idade. Medite por quinze minutos em um lugar silencioso, faça o seu journaling e planeje milimetricamente o seu dia enquanto agradece por tudo aquilo que você tem. Tome seu café da manhã, sem açúcar. Você está fazendo o desafio de 30 dias sem açúcar, é claro. Agora é hora de ir para a academia, fazer yoga ou um treino de corrida, o importante é não ficar parado. Prontinho, agora é só tomar o seu segundo banho, passar mais uma dose de protetor solar e você está pronto para enfrentar o mundo. E ainda nem são 9h da manhã!!
Se você não quiser seguir esse cronograma à risca, não se preocupe! Há também a possibilidade de fazer como eu e passar grande parte do dia jogada na cama consumindo vídeos de influencers digitais que promovem rotinas de bem-estar e acordam antes das seis horas – ao mesmo tempo que a única coisa que chega perto de seis horas é o tempo de uso diário do meu celular.
São nesses momentos, nos quais eu fico completamente hipnotizada pelos vislumbres e pelas promessas de uma vida ideal, que percebo as enormes falhas da minha própria realidade. É como se, ao deslizar sem rumo pela tela, eu estivesse também deslizando por uma realidade paralela, onde todos parecem ter encontrado o segredo para uma existência plena – exceto eu.
Me pergunto então se essas rotinas obsessivamente saudáveis de fato fazem bem. Não me entenda mal, não estou questionando os benefícios de se cuidar. Sei que, para muitas pessoas – e muitas vezes inclusive para mim – rituais diários como meditação, journaling ou uma boa alimentação são a única forma de encontrar algum tipo de equilíbrio em meio ao caos e demandas do dia a dia. Há uma certa beleza em dedicar tempo e atenção a si mesmo, sendo às vezes esses pequenos atos que fazemos por nós mesmos a única coisa que verdadeiramente faz sentido em meio a todo o resto que não compreendemos.
O ponto é que, em um mundo onde a cada dia que passa novas regras aparecem ditando um tipo de receita de bolo para o bem-estar, fica fácil confundir autocuidado com uma espécie de competição silenciosa entre eu e eu mesma. O que deveria ser um convite à leveza e à serenidade torna-se mais uma exigência em meio a tantas outras, e algo que na teoria era um caminho para o sucesso acaba deixando ainda mais evidente o meu fracasso. Todas as vezes que acordo atrasada e lavo a franja na pia do banheiro ao invés de seguir um cronograma capilar sinto que falhei como mulher, da mesma forma que tenho para mim mesma que não há nada que indique maior fracasso pessoal do que esquecer de passar o protetor solar antes de sair de casa. Me encontro então perdida entre a busca pela felicidade diária e a necessidade básica de simplesmente sobreviver.
Muitas vezes, quando tento seguir uma rotina saudável à risca, não é apenas uma questão de acordar cedo, de meditar por quinze minutos ou de aplicar o sérum da maneira correta – após a limpeza, mas sempre antes do hidratante –, mas de internalizar que se eu não conseguir atingir tudo aquilo que me propus, não sou boa o suficiente. O autocuidado, que deveria ser um espaço de respiro, torna-se extremamente sufocante, como se fosse uma nova modalidade de ansiedade, um novo peso sobre os ombros.
No fim, como todos já imaginam, a chave está em encontrar um meio-termo entre a extrema disciplina e o verdadeiro bem-estar. É perceber que o autocuidado é nos permitir não ser tão perfeitos e aceitar nossa bagunça, nossas falhas, e principalmente, as nossas inconsistências. É entender que há dias em que acordar tarde e esquecer o protetor solar não é o fim do mundo, apenas uma lembrança sutil de que somos, antes de tudo, humanos. No fundo a chave é o equilíbrio. Obviamente, eu ainda não consegui encontrar esse equilíbrio – se o tivesse feito, nem haveria razão para esse texto existir. Mas, se um dia eu finalmente achar esse ponto mágico, prometo voltar para compartilhar... Ou para admitir que o segredo era simplesmente aceitar a bagunça o tempo todo. Quem sabe…
Nota da Autora:
A ideia de escrever esse texto surgiu após eu ter assistido um vídeo do Jorge Grimberg no qual ele discorre a respeito do conceito de “anti-rotina”. Se quiser se aprofundar um pouco nesse assunto, acho que vale a pena dar uma olhada…
Autoria: Victorya Pimentel
Revisão: Laura Freitas e André Rhinow
Imagem de capa: Post de Natura Ferrer no Pinterest
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