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É SÉRIO?

Um relato pessoal que reflete a delicada atmosfera socio-econômica da fundação em que vivemos e estudamos. O espaço aberto de hoje nos deixa com uma reflexão que todos devem fazer: “é sério que temos que viver isto?”

É sério? Esta é uma das coisas que eu mais tenho dito ultimamente como aluna da FGV, e por via das dúvidas, o “tom” em que pronuncio é o de indignação mesmo. Desde que me tornei aluna da Fundação tenho tido experiências inesquecíveis, tanto boas quanto ruins, e mesmo estas, acredito fazer parte do meu processo de crescimento, e suponho que para muitos de vocês também. Hoje, venho falar de uma dessas vivências minhas, que me marcou -muito-, e acho que não serei capaz de esquecer, e escrever sobre ela reforça tal ideia. O assunto ao qual tratarei é desconfortante, -ainda mais porque envolve outra pessoa que possivelmente não saberá que escrevi este texto- e em minha cabeça não entendo -mesmo- como pode acontecer, ou no caso, como aconteceu, e comigo……


No meu segundo semestre da graduação, estava indo ao prédio de Economia - EESP, não me recordo o porquê, mas quando eu estava voltando de lá fui em direção ao elevador e havia uma senhora da limpeza com um saco de lixo em mãos esperando o elevador. Eu dei um “bom dia” para ela, e senti um desconforto ou estranhamento dela em me cumprimentar de volta, mas respondeu em voz baixa. Até aí tudo “bem”, pessoas têm dias ruins, não da para ser sempre responsivo ou recíproco, mas eu não podia esperar pelo que aconteceria em seguida. Agora, imaginem -na EESP, térreo para melhor retratação do cenário- ela à espera do elevador próximo as catracas e eu, na outra ponta, o elevador de onde ela estava chegou antes, e ela não entrou. Suponho que alguns já imaginem o motivo, outros não. Sou bolsista socioeconômica na FGV, e já me peguei por muitas vezes diminuindo as situações que pagantes passam, tento ao máximo me policiar para não ser egoísta e perceber que posso estar sendo injusta, pois, mesmo que as pessoas tenham condições sociais diferentes da minha “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”.


Entretanto, algo que não dá para abrir mão e que independe da condição social, é o respeito as pessoas, isto, realmente, não tem discussão, e em geral a ideia de que situações como a que tratarei ocorram em espaços aos quais poucas pessoas têm a oportunidade de frequentar, é mais comum.


Continuando o ocorrido, ela não entrou, portanto, me direcionei para entrar no elevador e segurei a porta para que ela fizesse o mesmo, mas não foi o que aconteceu. Então, lá estava eu segurando a porta, e ela não apareceu (isso levou alguns segundos, infelizmente não consigo trazer fielmente o que foi aquele tempo). Como percebi que ela não entrava, olhei para fora e notei que ela estava em frente ao elevador do meio, “aparentemente” esperando que ele chegasse, então perguntei: “a senhora não vai entrar?” e ela me respondeu com uma pergunta: “eu posso?”.


Devido a minha realidade, aquela pergunta doeu muito, só pude ser capaz de responder, segurando lágrimas: “é claro que a senhora pode entrar que pergunta é essa, nunca deixe que te digam o contrário”. Assim, ela me contou que entrar é receber “olhares” não bons, e eu só consegui dizer para ela ter força e não baixar a cabeça para ninguém, mas eu sei o quanto colocar isso em prática é extremamente difícil na GV, pois, como aluna, tenho inúmeras inseguranças, não me sinto bem no fumódromo, no “shocks” e em diversos outros lugares, imagina-se alguns trabalhadorxs?


Enfim, termino este texto com muitos questionamentos, que podem vir a ser reflexões para vocês igualmente. Será que a senhora -a qual infelizmente não perguntei o nome- vai ler o que escrevi? Será que estou certa de escrever sobre isso, sendo que envolve uma outra pessoa? Será que vocês conseguirão ser atingidos por este relato e tentaram se policiar sobre atos diários em relação aqueles que diariamente conservam os espaços que proporcionarão vocês a se tornarem os profissionais que almejam? Será que devo colocar o meu nome, mostrar uma parte da minha história para pessoas que -mesmo sem saberem- me causam insegurança? Será que este texto é só mais um ou vamos pensar em maneiras de mudar aos poucos essas situações? Será que ainda cansarei mais do que imagino de dizer: “é sério?”.

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